sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Embrutecimento do Ser Humano (Daniela Costa)


Muitas vezes nos questionamos sobre o que é certo ou errado, ético ou não, sobre nossas convicções, e principalmente, sobre a opinião alheia. Ontem mesmo, ouve um acirrado debate na faculdade sobre o documentário “O Prisioneiro da Grade de Ferro”, realizado no extinto complexo penitenciário do Carandiru, pelo diretor Paulo Sacramento.
Para quem ainda não teve a oportunidade de assistir, o filme faz refletir sobre o sistema carcerário brasileiro, mostrando o dia a dia dos presos. O grande diferencial na verdade, foi a forma inovadora que o autor utilizou para obter as imagens, deixando que os personagens principais da trama, gravassem sua própria história. A intenção era fazer um documentário imparcial, mostrando todos os lados da moeda. E mesmo sabendo que a imparcialidade total não existe, creio que o autor se aproximou muito de seu propósito inicial.
O fato é que este tipo de trabalho gera sentimentos diversos àqueles que o assistem. Cada telespectador terá uma visão diferenciada sobre o assunto. Nossa orientadora, como manda o figurino, quis mostrar aos alunos a necessidade de assistir a este documentário, apenas observando os fatos, sem tomar partido, sem fazer pré-julgamentos, ou , como adoram dizer, sem cair no senso comum. Afinal, aqueles que estão lá, no presídio, já foram julgados e condenados pela justiça. O que realmente faz sentido, partindo do princípio que estamos falando de uma turma de estudantes de jornalismo, e não de direito. E sabendo também que a função do jornalista jamais foi a de julgar e condenar, e sim, apenas levar a informação à sociedade, seja ela qual for, baseando-se, é claro, na verdade.
Mas, deixando de olhar o curso em específico e passando a analisar o ser humano por trás do diploma, qual será a opinião de cada um?
Nossa orientadora, ficou chocada, ao perceber que alguns alunos não se sensibilizaram com a situação dos presos ao assistirem às péssimas condições do presídio, a má alimentação, a falta de segurança, a violência interna, a escassez de apoio médico e a precariedade generalizada. Nem mesmo quando foram exibidas cenas de corpos mutilados, muitos alunos, não se condoeram.
Outros, defenderam os direitos humanos, culparam a sociedade, o governo, o sistema, como se isso justificasse a prática da violência.
Mas será mesmo que nascer pobre, sentir fome, frio, sede, não ter oportunidades, será que por pior que seja a condição do ser humano, isso é o suficiente para justificar crimes hediondos, como os praticados contra o menino João Hélio, arrastado por quarteirões? Contra a menina de seis anos, estuprada e morta no triângulo mineiro, ou contra um casal de jovens, que em um momento de lazer, decidiram prestar socorro a um suposto agonizante, e foram rendidos, ocasionando a morte do rapaz e a perda da sensibilidade das pernas da jovem, que além de ser baleada, também foi covardemente estuprada? Será que as más condições sociais, justificam que qualquer um cometa qualquer tipo de crime, contra seu semelhante?
A realidade nos mostra diariamente uma sociedade que se torna cada vez mais endurecida. Já não nos chocamos ou comovemos com as barbáries ocorridas, pois afinal, elas ocorrem constantemente. A atrocidade de ontem, já não é lembrada amanhã, pois outros acontecimentos similares já se tornaram notícia.
Fatos que deveriam ser motivo de protestos, de manifestações, de abaixo assinados, de um movimento conjunto da população, tornam-se corriqueiros, normais, e isso, é terrivelmente assustador.
As pessoas parecem não mais se importar, simplesmente deixam que o medo e a violência as paralisem.
E se eles, os algozes, não têm piedade de homens e mulheres de bem, pessoas que trabalham honestamente e lutam por condições melhores de vida, pais e mães que criam com sacrifício seus filhos, jovens que tentam desesperadamente encontrar um lugar ao sol, brasileiros que diante de tantas dificuldades, negligências, carências, persistem bravamente, como esperar que se defenda os direitos humanos de seres, que não nos parecem humanos?
Como acreditar na justiça, se mesmo quando ela é feita, vidas já foram perdidas? Por que esperar que as tragédias sociais aconteçam e deixem seus rastros catastróficos, para depois tentar remediar, o que já não tem remédio? Por que nós, os governantes, pensadores, filósofos, estudantes, trabalhadores, operários, a massa, não tentamos lutar contra esse mal, que está nos destruindo pouco a pouco?
Se a raiz do problema parte de uma sociedade extremamente capitalista, individualista, consumista e desigual, por que então não mudar práticas e conceitos falhos e ultrapassados? Por que não rever as leis que se baseiam em uma sociedade pré histórica e não acompanham a realidade? Por que aceitarmos que poucos decidam sobre o rumo de nossas vidas, sem questionarmos sua conduta, sua ética, seus desmandos, e sem exigirmos que cuidem do nosso povo, que sarem nossas feridas, fazendo o que estão sendo pagos por nós para fazer? Que distribuam o dinheiro cobrado do povo de forma justa, sanando suas necessidades essenciais. Que nos ofereçam o que nos pertence por direito, que é o acesso à saúde, à alimentação, à educação, ao trabalho e principalmente que devolvam a nossa dignidade.
A que ponto ainda mais grotesco e repugnante teremos que chegar para começarmos a mudar esta realidade? O fato é que todos estamos sujeitos às falhas deste sistema contaminado e corrompido. Todos estamos expostos às suas trágicas conseguências, e é por isso, que o problema é de todos nós. Afinal, quem são os verdadeiros prisioneiros das grades de ferro, os moçinhos ou os bandidos?
E quem são os verdadeiros culpados por termos chegado a este estado total de degradação humana?